terça-feira, janeiro 13, 2009

Entre cinderelas e monstros


Como não desejar o que já foi desejado antes, um desejo afirmado, convencido, domesticado para uma só satisfação? Como fazer do sofrimento a potência da revolta e não o xilique da mulherzinha? Como libertar um fluxo que não encontra companheiros potencializantes? Só liberando... Um que não vinga, outro que goza, um que brinca, outro que broxa, um que escreve, outro que chora, outro e outro ainda... O que não posso é deixar que os fluxos que por mim passam se domestiquem, assim, facilmente, docilmente, como se as minhas únicas possibilidades fossem ser dócil ou brava... Nem dócil nem brava! Não quero ter nome! Não me nomeiem! Vocês, que pouco se ocupam do que por vocês passa... Apenas deixam passar sem nada modificar, sem nada criar com o que a vida lhes dá, de graça. Preferem sua existência doméstica comprada a prestação de desejo, com seus cães tratados como bebês, como se pudessem ensiná-los a falar! Vocês me dão nojo! Não posso habitar um mundo de um povo que pensa ser proprietário do que pensa... Não, queridinhos, pensamento não se tem, pensamento é o que passa por nós para violentar a existência e não para docilizá-la! Não sou eu que sou brava! É a existência que se enraivece:
Daiana tirava um tatu do nariz durante o jantar de família...
- Minha filha, uma princesa não bota o dedo no nariz!
- Mas eu não quero ser princesa, mãe! Quero ser monstro!

Para Lesmari Bitencourt


Meu olho esquerdo tem um ponto de vista, o outro tem outro. O dedo anelar da minha mão direita tem um ponto de vista, mas briga com o ponto de vista da sua falange do meio. Aquele poro mais aberto que tenho na ponta do nariz julga ter um ponto de vista privilegiado; o ponto de vista do dedo mindinho do pé tem inveja. O sol não gosta muito de seu ponto de vista, preferia ter ficado na borda, acha legal o ponto de vista de Plutão, mas acabou no centro. Uma estrela riu dele esses dias: quem disse que você está centro? Hahaha! Você está parecendo aquele exemplar daquela espécie que vive lá num planetinha que vive em volta de você. Esta espécie desenvolveu um ponto de vista que a faz pensar que só ela tem ponto de vista. O exemplar, que eles chamam de Bush, também achou que seu ponto vista era o centro... Ai, ai, ai... O que faz de um ponto vista melhor ou pior? Não há melhores e piores! Cada ponto de vista é só um ponto de vista! Só há perspectivas. E este é o melhor dos escambos: trocar pontos de vista! E eu ando querendo um ponto de vista de lesma...
Alguém tem pra trocar?
*Imagem: Mundo Ovo de Eli Heil